Fernando
Nogueira
Certa vez um conhecido meu (alinhado com a esquerda hype pós-modernosa) atacava a garotada: “essas pessoas ficam se dizendo ‘marxistas’, ‘socialistas’, mas nunca leram ‘O Capital’; mal mal leram o ‘Manifesto Comunista’. E ficam aí achando que entendem alguma coisa do mundo, que mudarão alguma coisa. Não sacam porra nenhuma!”
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Que imbecil. Pós-moderno tiradinho hipster é foda.
Então: certas coisas só se aprendem na prática, na movimentação real do mundo, no dia-a-dia. Deve-se entender que certos aspectos da realidade só são compreensíveis por quem a vive diretamente.
Ou seja: o comum do povo.
Tá certo que a ideologia interfere nessa compreensão, fazendo ficar nebuloso o que está bem embaixo do nariz. Maluco é hiper-explorado, tem seus/suas filhxs torturadxs e assassinadxs pelo Estado, mas acha que este é o fardo que Deus lhe deu para carregar. Que é pobre, mas digno: respeitador das leis (que o oprimem)...
Aqui é onde a militância é central. Essa militância preparada, estudada, experimentada nos mais diversos fronts: é preciso aqui construir fissuras, falhas e ruídos para que a posição de vida dx cidadãx mova-se um pouco que seja, para que tal cidadãx possa ver, por si mesmx, as mesmas coisas de sempre com outros olhos.
A junção – dialética, contraditória, problemática sempre – entre experiência prática/vivência de opressões e estudo/formulação de teorias revolucionárias (em uma mesma pessoa, ou entre uma e outra, ou em nível de mulão) dão algum espaço para a aposta na vitória revolucionária. A união/fusão entre massa e militância lança a potência transformadora para outros níveis, mais elevados (mas nunca garantidos).
Quem faz a revolução, sempre, são os condenados da terra, e não os “heróis”, os “intelectuais”, os “grandes homens da história”: parafraseando o lindo poema de Brecht, se lembramos de Lenin ou Mao, é porque eles só contribuíram para a articulação e a otimização de uma luta feita em massa, nos mais profundos rincões da Rússia e da China, por gente anônima, que mal sabia ler e escrever, mas que sabia que o que viviam não era aceitável, e que era preciso mudar a vida.
Quem faz a revolução é o povo. Os letrados nas armas da crítica só catalisam, facilitam, ajudam na organização.
Quando Amilcar Cabral, revolucionário africano gigantesco, foi confrontado com a suposta “necessidade” de preparação educativa para a luta de libertação nacional de Guiné-Bissau e Cabo Verde do jugo colonial brutal de Portugal, respondeu: “a libertação é um fator de cultura”. Acertou genialmente: a luta ensina, e o aprendizado sólido e correto só se dá na luta. Não se precisa esperar que a população seja mais “educada” para aspirar e lutar por uma vida digna e livre.
Não tem “O Capital” que ensine mais do que uma boa jornada de lutas de rua. Para avançar, não precisamos ser doutores do Saber formalizado. Precisamos apenas de dizer “sim” à liberdade, à solidariedade, à dignidade.
E isso qualquer zé-ruela leitorx (ou não) do “Manifesto Comunista” faz facim, facim.
Brasil em 5
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