terça-feira, 26 de fevereiro de 2013
Com chuva ou com sol, miséria no semiárido da Paraíba
Couto diz que ‘cultura da seca’ continua arraigada na sociedade
Deputado indaga se setores da política continuarão com velhos discursos
O deputado Luiz Couto (PT-PB) disse na segunda-feira (25/2), em pronunciamento na Câmara Federal, que a seca tem um forte conteúdo cultural por causa dos aspectos políticos, desafios técnicos e, principalmente, dos discursos impregnados de sofismas, de silêncios, de significados obsoletos e interesseiros para uma parte das elites regionais. Portanto, “não se resume à ausência de chuvas e escassez de água e prejuízos decorrentes”.
Couto ressaltou que a cultura da seca permanece arraigada em alguns setores da sociedade nordestina, particularmente nos meios políticos partidários, em segmentos da imprensa e da mídia em geral. Para ele, as falas nos meios políticos, repercutidas sem a devida crítica pelos meios de comunicação, repetem-se há um século e mais atrapalham do que contribuem para a superação “do que chamamos de cultura da seca”.
Segundo o parlamentar, problema dos efeitos da estiagem e a sua resolução continuam sendo localizados fora do alcance das pessoas mais afetadas. “Pelo visto e pelo dito por políticos e jornalistas, ao povo resta se lastimar dos prejuízos, culpar os governos federal e estadual e assinar abaixo-assinados para reclamar soluções aos poderes públicos”, acrescentou.
Luiz Couto indagou se setores da política nordestina e da opinião pública vão insistir nos velhos discursos. Perguntou se há disposição para fazer avançar uma abordagem nova para a questão da seca. Quis saber acerca do compromisso de todos e de cada um em assumir deveres para com o semiárido. Por fim, questionou: “será que sairemos da seca atual com a mesma mentalidade de antes?”
Confira pronunciamento na íntegra:
- Senhor Presidente, Senhoras Deputadas e Senhores Deputados. Estamos a quase dois anos convivendo com uma das maiores estiagens no semiárido brasileiro. À falta de chuvas acrescente-se a destruição da lavoura da palma com a cochonilha do carmim, agravando ainda mais a situação de perdas econômicas dos agricultores e criadores dos sertões. Mas, como já tratamos aqui em outras oportunidades, a seca não se resume à ausência de chuvas e escassez de água e prejuízos decorrentes.
A seca tem um forte conteúdo cultural, por seus aspectos políticos, por seus desafios técnicos e principalmente por seus discursos impregnados de sofismas, de silêncios, de significados obsoletos, mas ainda interesseiros para uma parte das elites regionais.
A cultura da seca continua arraigada em alguns setores da sociedade nordestina, principalmente nos meios políticos partidários e em segmentos da imprensa e da mídia em geral.
Às agruras da recente estiagem nos sertões, soma-se a renitência de um discurso que nunca ajudou a população na busca de soluções para conviver com este acontecimento cíclico. As falas nos meios políticos, repercutidas sem a devida crítica pelos meios de comunicação, repetem-se há um século e mais atrapalham do que contribuem para a superação do que chamamos de cultura da seca.
Um forte elemento da cultura da seca do Nordeste é a vitimização do povo sertanejo, raramente visto como protagonista das continuidades e das descontinuidades nas estruturas econômicas, no espaço geográfico e no processo histórico.
O problema dos efeitos da seca e a sua resolução continuam sendo localizados fora do alcance das pessoas mais afetadas pelo fenômeno recorrente. Pelo visto e pelo dito por políticos e jornalistas, ao povo resta se lastimar dos prejuízos, culpar os governos federal e estadual e assinar abaixo-assinados para reclamar soluções aos poderes públicos.
No desespero dos segmentos populacionais afetados pela ruína da seca ninguém tem motivação para aprofundar minimamente o olhar sobre tal situação. A busca de soluções redentoras mais confunde do que ajuda a entender o desafio que precisa ser enfrentado: O desafio do desenvolvimento sustentável da região.
Tomemos a título de exemplo a situação da agropecuária no Estado da Paraíba na última década (entenda-se aqui agropecuária e não agronegócio). Segundo os estudos do IPEA, em 2002 a participação da agropecuária na formação do Produto Interno Bruto da Paraíba foi de 7,58% (sete vírgula cinquenta e oito por cento), enquanto que no ano de 2008 o mesmo setor primário contribuiu com 6,10 % (seis vírgula dez por cento) na formação do PIB estadual.
Esta redução na participação do PIB deve-se a uma forte queda na produção agropecuária em 2007. Esses números são muito próximos dos números do país, onde a participação da agropecuária no PIB brasileiro em 2008 foi de 5,92%.
Mas é preciso deter-se melhor nas peculiaridades da vida no meio rural da Paraíba. Em termos demográficos, enquanto no Brasil 15,6% da população habita na zona rural, esse percentual sobe a 24,6% na zona rural da Paraíba (IBGE, 2010). Se considerarmos que na maioria das cidades paraibanas, notadamente nas pequenas cidades, há um grande número de pessoas que trabalham no campo, a relação entre a ocupação da população economicamente ativa e a agropecuária abrange um percentual bem maior de paraibanos. Ou seja, o peso relativo do número trabalhadores vivendo da agropecuária na Paraíba é bem mais elevado do que no Brasil.
Entretanto, outro aspecto é gritante na Paraíba: Segundo o IPEA a renda dos paraibanos e paraibanas na zona rural apresenta números muito desfavoráveis no contexto do próprio estado.
Em 2009, enquanto a renda familiar per capta na Paraíba era de R$ 422,9 ao mês, na zona rural a renda familiar per capta era de apenas R$ 226,2. Se o parâmetro for o índice de extrema pobreza (para quem dispunha de menos de R$ 67,00/mês), a situação não é melhor: enquanto no conjunto do Estado 10,4% de paraibanos estavam na miséria em 2009, este percentual saltava para 15,1 % na zona rural. Em suma, faça chuva ou faça sol, o setor da agricultura e da pecuária na Paraíba concentra os piores índices de miserabilidade do Estado.
Tudo isto num quadro mais geral em que a população da Paraíba representa aproximadamente 2% da população do Brasil, enquanto que o PIB estadual não alcança 1% do PIB nacional.
Neste contexto de subdesenvolvimento mais acentuado de um pequeno estado nordestino num país que ainda carrega chagas de nação subdesenvolvida, a seca é um sério agravante, mas não é o problema maior. O desafio do semiárido é mais abrangente do que a sua natureza.
As ações emergenciais amenizam, apenas em parte, os efeitos destruidores da seca. O povo nordestino quer é a consecução das grandes obras de transposição de águas entre bacias hidrográficas, bem como a continuidade e expansão do trabalho em rede para pequenas grandes obras coordenadas ou inspiradas pela ASA. Para que a água chegue e tenha bom uso em todos os quadrantes do sertão. Mas e os sertanejos? Os sertanejos estão prontos para dar um salto de qualidade no jeito de ser e no jeito de viver na região?
É preciso indagar a determinados setores da política nordestina e a autoproclamada opinião pública se ainda vão insistir com o anacronismo dos seus velhos discursos? É preciso perguntar sem meias palavras aos conterrâneos e conterrâneas se há disposição para fazer avançar uma abordagem nova para essa velha questão da seca? Que papéis cada sertanejo deve cumprir neste cenário? Para além dos direitos, que disposição e compromisso há de todos e de cada um de assumir deveres para com o semiárido?
Ou será que sairemos da seca atual com a mesma mentalidade de antes?
Era o que tinha a dizer.
Assessoria de Luíz Couto
Mais PB
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