Luiza Sansão
Veículo blindado da PM é símbolo de terror para moradores de favelas. Campanha lançada este mês luta para bani-lo de operações policiais
“É o carro do horror. Quando ele vem, chega devastando tudo”, diz a cabeleireira Nadia Santos, moradora do Chapadão, na Zona Norte do Rio de Janeiro, ao se referir ao Caveirão — veículo blindado da Polícia Militar do Estado. “O Caveirão é uma proteção para os policiais. Quando eles entram na favela dentro de um Caveirão, nada acontece com eles. Mas é de onde os policiais atiram. Eles vêm na maldade sabendo que não serão atingidos. Só quem está fora é atingido”, completa. Seu filho, Cleyton, foi morto aos 18 anos por policiais, em 2015.
A sensação de Nadia não é diferente da que têm outras mulheres que tiveram seus filhos assassinados por policiais em favelas. “Pra quem mora na favela, a imagem do Caveirão é de terror, de medo. Quando o Caveirão entra, as pessoas correm, geralmente fecham suas portas, porque ficam aterrorizadas. O veículo é bem grande e, geralmente, quando ele entra na favela, ele já entra destruindo tudo o que estiver pela frente. Então dá muito medo mesmo. A imagem do Caveirão, pra gente, simboliza a morte”, diz Ana Paula de Oliveira, moradora da favela de Manguinhos, também na Zona Norte da capital fluminense. Seu filho Johnatha foi morto em 2004, aos 19 anos, com um tiro nas costas, disparado por um policial da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da comunidade.
O veículo blindado é visto como um instrumento destruidor. Como as ruas das favelas, em geral, são estreitas, ele arrasta o que estiver na frente, muitas vezes depredando calçadas, motos, carros e outros objetos. “Minha calçada está rachada, minha rua está esburacada, de tanto que passa Caveirão. Eles não conseguem subir, ficam com a roda rodando, forçando, aí acaba fazendo buraco na rua. Fora que derruba tudo, já quebraram barraquinha dos outros, muros. Os muros daqui são tudo quebrado pelo Caveirão”, critica Nadia.
Além disso, como mostrei em matérias anteriores, o Caveirão é usado pela PM do Rio para destruir equipamentos de som de produtores culturais em favelas. Somente neste ano, pelo menos cinco ocorrências desse tipo em favelas do Rio durante eventos musicais foram registrados pelo DefeZap — serviço que permite o envio de vídeos-denúncias de violações de direitos praticadas por agentes do Estado e encaminha as denúncias aos órgãos competentes preservando as identidades dos denunciantes.
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Memória sinistra
“Antigamente, quando o veículo ainda era uma novidade, eles tinham um alto-falante, os policiais falavam, de dentro dele, ‘eu vim buscar a sua alma’. Falando uma frase dessa, é como um monstro que está ali para destruir as pessoas e tudo o que tiver na frente”, recorda Ana Paula.
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Blog da Luiza Sansão
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