Presidente do Supremo e procuradora-geral cobram liberdade às universidades
Toffoli diz que universidades são autônomas; Dodge vê indícios de excesso em ações
Reynaldo Turollo Jr.; Letícia Casado
O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Dias Toffoli, e a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, cobraram nesta sexta-feira (26) autonomia e liberdade nas universidades, após ações policiais e da Justiça Eleitoral proibirem discussões sobre democracia e fascismo e retirarem faixas com dizeres antifascistas, sob a justificativa de coibir propaganda eleitoral irregular em prédios públicos.
Ações judiciais e policiais em universidades públicas do país
A Procuradoria-Geral da República entrou com ação no STF para garantir a liberdade de expressão e de manifestação nas universidades.
“Por verificar que no curso dessas medidas há indícios claros de que houve ofensa à liberdade de expressão, de reunião, de cátedra, estou requerendo ao Supremo Tribunal Federal medidas no sentido de assegurar a plena vigência da Constituição”, afirmou a procuradora-geral durante uma sessão no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) à tarde.
A ADPF (arguição de descumprimento de preceito fundamental), ajuizada por Dodge, é um tipo de processo que visa reparar ou evitar lesão a preceito fundamental resultante de ato do poder público, com pedido de liminar (para decisão imediata). A relatora da ação será a ministra Cármen Lúcia.
O texto quer proibir o "ingresso de agentes públicos em universidades públicas e privadas, o recolhimento de documentos, a interrupção de aulas e debates, a atividade disciplinar docente e discente e a coleta irregular de depoimentos".
Também pede a nulidade de todos os atos já praticados e que outras autoridades públicas não possam mais realizar ações do tipo.
Já Toffoli disse, por meio de nota, que a corte "sempre defendeu a autonomia e a independência das universidades brasileiras".
"O Supremo Tribunal Federal, como guardião da Constituição Federal, sempre defendeu a autonomia e a independência das universidades brasileiras, bem como o livre exercício do pensar, da expressão e da manifestação pacífica. Essa Liberdade é o pilar sobre o qual se apoia a própria noção de Estado Democrático de Direito. No julgamento da ADPF 130, o Tribunal reafirmou que 'a Lei Fundamental do Brasil veicula o mais democrático e civilizado regime da livre e plena circulação das ideias e opiniões'", afirmou.
Mais cedo, a presidente do TSE, ministra Rosa Weber, também do STF, anunciou que a corregedoria eleitoral vai investigar se houve excessos na série de ações em universidades públicas por todo o país ordenadas pelos TRE (Tribunais Regionais Eleitorais).
Os ministros do Supremo, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Luís Roberto Barroso também se manifestaram sobre o assunto.
Lewandowski disse que a presença da polícia em universidades afronta a autonomia desses espaços. "A presença de policiais nos espaços acadêmicos afronta a autonomia universitária e a liberdade de manifestação do pensamento que a Constituição garante aos professores e estudantes", afirmou.
Gilmar Mendes pediu cautela em ações da justiça em universidades. Para Marco Aurélio, interferência externa nas universidades é incabível. Barroso afirmou que a polícia só deve entrar em universidade se for para estudar.
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão também divulgou nota nesta sexta afirmando que as medidas registradas nas universidades são potencialmente incompatíveis com o regime democrático.
“A interpretação de dizeres 'Direito UFF Antifascista', 'Marielle Franco presente', 'Ditadura nunca mais', bem como outras iniciativas de debates acadêmicos ou manifestações públicas a partir do espaço de ensino, como sendo uma forma de propaganda eleitoral transborda os limites da razoabilidade e compromete o arcabouço constitucional da liberdade de manifestação e de cátedra, bem como de expressão do pensamento e intelectual”, diz a nota.
“A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão entende que são potencialmente incompatíveis com o regime constitucional democrático iniciativas voltadas a impedir a comunidade discente e docente de universidades brasileiras de manifestar livremente seu entendimento sobre questões da vida pública no país —tais como as que ocorreram nos últimos dias 23 a 25 de outubro, em mais de uma dezena de universidades brasileiras.”
Houve diferentes operações em universidades pelo país. A Justiça eleitoral mandou suspender aulas públicas e eventos com temas como fascismo, democracia e ditadura na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e na da Grande Dourados (MS).
Também ordenou a retirada de uma faixa que dizia “Direito UFF Antifascista” na escola de direito da Universidade Federal Fluminense, em Niterói (RJ). Em Campina Grande (PB), houve inspeção do TRE em aulas da universidade federal local.
Após os eventos, o presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Claudio Lamachia, reafirmou, em nota, a posição da entidade em defesa do direito de livre manifestação.
“As universidades devem ser respeitadas como espaço autônomo de promoção de debates e discussões, assegurado o direito de todos os integrantes da comunidade acadêmica —sejam de direita ou de esquerda— de exporem seus posicionamentos, sempre dentro dos limites da lei. A OAB condena toda forma de censura e de violência política”, disse.
Folha SP
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