Augusto Vasconcelos
O discurso de Bolsonaro sobre a Justiça do Trabalho revela profunda desinformação. Aliás, como em quase todo o pensamento hegemônico nesse governo, se apegam a mitos para justificar seus interesses, apelando para a ignorância dos acontecimentos.
Não é verdade que o Brasil é o único país que possui uma jurisdição Trabalhista. Inglaterra, Nova Zelândia, Suécia, Noruega, Finlândia, Alemanha, França, Bélgica e México, por exemplo, possuem variados níveis de organização de juízos de primeiro grau ou Tribunais especializados na matéria.
Nos EUA, a despeito de não ter órgãos judiciais especializados, há uma vasta jurisprudência, inclusive na Suprema Corte, tratando do necessário caráter protetivo para os trabalhadores. Em razão de que predomina o sistema do common Law, os precedentes judiciais possuem uma força enorme em território norte-americano e há centenas deles em matéria laboral. Sem falar que nos EUA, também os Estados possuem competência para legislar sobre contratos de trabalho, enquanto no Brasil a competência é privativa da União, conforme prevê o Art. 22 da Constituição Federal.
O Direito do Trabalho só existe ao considerar como premissa de que há uma diferença ontológica em negociações cujo objeto é a força de trabalho humana. Caso encarássemos como um contrato qualquer, as relações de trabalho poderiam ser regidas pelo Direito Civil. Mas exatamente pelo fato de que o que está em jogo são vidas humanas, que não podem ser meramente mercantilizadas, é que surgiu um ramo autônomo do Direito, com princípios próprios e legislação especializada.
A maior parte das ações trabalhistas no Brasil, referem-se a falta de pagamento de verbas rescisórias, ou seja, valores que as empresas não repassaram aos trabalhadores em um eventual desligamento, tais como aviso prévio, multa do FGTS, férias proporcionais e salários proporcionais. Ou seja, independente de existir ou não Justiça do Trabalho, o descumprimento da lei continuará existindo. O governo propõe que os trabalhadores abram mão desses direitos?
Outra falácia constantemente anunciada é de que a legislação trabalhista impede o crescimento econômico e a geração de empregos. Quanta tolice! O Brasil atingiu a menor taxa de desemprego da história em dezembro de 2014 com a vigência da antiga CLT. Após a Reforma Trabalhista que flexibilizou e criou novas modalidades de precarização do trabalho não há qualquer indicador que revele impactos decisivos na geração de empregos.
O que possibilita mais empregos e de melhor qualidade é desenvolvimento econômico. Enfrentar os gargalos da infraestrutura, retomar investimentos, reduzir juros e estimular a produção científica e tecnológica. A desburocratização é bem-vinda, mas jamais os trabalhadores ou a Justiça do Trabalho foram empecilho para isto. A média salarial dos brasileiros está entre as mais baixas do mundo e não é obstáculo para crescimento do país. Ao contrário, com salários maiores haveria maior distribuição de renda e a própria economia poderia se beneficiar com aumento do poder aquisitivo da população.
Nosso país firmou Tratados Internacionais se comprometendo em erradicar o trabalho infantil, combater o trabalho análogo à escravidão e promover o trabalho decente. Este governo dá sinais de que irá na contramão desses objetivos. Fechou o Ministério do Trabalho, esvaziou as atividades de fiscalização, ataca o Ministério Público do Trabalho e mira agora na Justiça do Trabalho. Onde vamos parar? Querem transformar o Brasil em uma Bangladesh, com mão de obra barata, exportador de produtos primários e dependente de grandes Nações para obter produtos industrializados.
* Augusto Vasconcelos é presidente do Sindicato dos Bancários da Bahia, advogado, professor universitário, mestre em Políticas Sociais e Cidadania (UCSAL) e especialista em Direito do Estado (UFBA)
Carta Capital
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